Pós-graduações IMED 2013

segunda-feira, 25 de maio de 2009

O Cérebro e a Mente

Por mais que os profissionais lutem contra o pensamento cartesiano no estudo do comportamento, é curioso observar como o entendimento da relação entre mente e cérebro ainda está permeada por esta divisão. É muito comum que escutemos em congressos, seminários, leiamos em livros e artigos frases como "É essencial considerar o ser humano como um todo integrado" ou "Não há como separar o comportamento de sua base biológica". Se as pessoas dizem isso com tanta frequência, deve ser porque os profissionais ainda devem ser convencidos que essa divisão não deve acontecer. Isso porque ela acontece na prática.

Um dos pontos em que isso pode ser observado é na descrição usual da relação entre a mente e o corpo. Por óbvio que são coisas distintas, mas inter-relacionadas. Se perguntarmos a um profissional da saúde mental qual a relação entre as duas, dirão, como exposto acima, que não há como dividir, etc. Mas aprofundando o questionamento, os psicólogos parecem pender a balança para algo do tipo "os aspectos emocionais/cognitivos influenciam mais o comportamento" enquanto que o campo médico/biológico enfatiza a "estrutura e funcionamento" do cérebro.

Esse jogo de forças conceitual pode ser facilmente resolvido com o entendimento da teoria da evolução das espécies. A evolução preconiza que as modificações do organismo de uma espécie ocorreram para que ela tenha melhores condições de sobrevivência, e, principalmente, de reprodução. O cérebro e o comportamento de nossa espécie também estão sujeitos a estes mesmos princípios: se hoje pensamos e sentimos da forma como fazemos, isto é produto das forças que delinearam e modelaram o cérebro. E o ambiente social é uma poderosa força modeladora: cérebro e mente co-evoluem a partir das influências ambientais, entenda-se, influências da sociedade, que é o ambiente humano natural.

Quanto melhor este tema for debatido nos cursos de formação, mais condições teremos de realmente superar a ponte que separa essa dicotomia cartesiana. Mas isso somente poderá ocorrer se os professores também conhecerem a teoria da seleção natural.

6 comentários:

Gisele Cristina Voss disse...

Então prof... não posso mais ver essas discussões na sua sala de aula...
mas aqui vem uma daquelas perguntas que eu faria.. hehe
pq usou cérebro e mente de forma separada?
falou da dicotomia mente e corpo.. tá, aí é uma parte que entendo e concordo com a titubeação q os profissionais ainda trazem e buscam separar tudo: "o q vc é?" "psicólogo" "tá, mas do q? é psicanalista, behaviorista, humanista?" - pq essa necessidade de separar, até nisso.. entao, separar corpo e mente é mais do q prático para isso...
Mas, cérebro e mente, seria pela evolução? um não acompanharia o outro? Não entendi o "co-evoluem"...
abraços dessa mente e desse cérebro inquietos!

Edurt disse...

No meu ponto de vista essa dicotomia só se extinguirá quando os profissionais das denominadas "ciências humanas" deixarem de ignorar os conhecimentos das "ciências natuarias" e partirem do pressuposto que a ciência é única. Mas para isso é necessário que seja quebrado o paradigma cartesiano que ainda vigora; mas que vem sendo posto a prova pela teoria sistêmica.
E acredito que essa discussão de humano como ser social/afetivo ou biológico/estrutural é tão inútil quanto discutir a velha questão "Quem vem primeiro, o ovo ou a galinha?", pois as respostas sempre estiveram na nossa frente. Coloco todas as fichas na mesa para aquele que tiver argumentos que provem que os afetos e relações sociais humanas nãos estão vinculadas às nossas estruturas fisiológicas e nosso código genético, e que por sua vez, esses últimos não são determinantes no comportamento.

Vinícius Ferreira disse...

Oi Gi, que bom saber notícias tuas e ter tua contribuição para estas discussões...

Então vamos lá: Por que o "co-evoluem"? Pelo seguinte: a mente é o resultado/produto do funcionamento do cérebro, portanto, ela depende de nossas estruturas cerebrais para existir, e consequentemente modificações no cérebro produzem modificações na mente. Mas a mente, via relações com o ambiente, também é capaz de modificar o funcionamento e a estrutura do cérebro, e desta forma, permite que o cérebro também evolua. É nesse sentido que coloco o "co-evoluem", pois um influencia o outro. A seleção natural se encarrega de facilitar a reprodução do "cérebro" que funciona melhor.

Era isso. Aguardo novos comentários. Abraços

Vinícius Ferreira disse...

Olá Edurt. Obrigado pelos comentários.

Concordo com a necessidade de transcendermos a dicotomia. Mas uma coisa que tem me chamado a atenção, dentre várias, é que vejo e escuto muitos colegas que defendem este ponto de vista, dizendo que essa separação é reducionista, etc., escorregando em comentários como: tal pesquisa é reducionista por esta razão (geralmente de pesquisadores que trabalham com metodologias qualitativas falando de pesquisas quantitativas) ou: tal pesquisa carece de embasamento "sólido" (geralmente de pesquisadores que trabalham com metodologias quantitativas falando de pesquisas qualitativas). Então há contradição.

Mas isso ocorre quando? Não é nos debates. Isso é muitas vezes conversa de corredores, a boca-pequena. Tenho visto que estas conversas ilustram às vezes muito melhor o status quo do que as "falas bonitas".

E, claro, há quem defenda que nossas estruturas fisiológicas/biológicas não teriam nenhuma influência sobre o comportamento. O que fazer quando um profissional assim atende um paciente que necessita de medicação? Grandes problemas surgem no horizonte.

Mas a discussão é longa...

Abraço.

Unknown disse...

A dicotomia é um efeito cultural, cartesiano: só percebemos o cérebro como tal a partir da "ex-sistência", desde uma dimensão extracerebral.Pode chamar de Consciência, se assim quiser.
Impossível não abrir a questão de uma dimensão transcendente e relacional.
Aliás nossa neurologia e mesmo nossa neuropsicologia se equivoca ao isolar o cerebro ou a mente ao investigá-los. Já começa por aí....
sergio@neurocom.com.br

Daniel F. Gontijo disse...

"[...] a mente é o resultado/produto do funcionamento do cérebro, portanto, ela depende de nossas estruturas cerebrais para existir, e consequentemente modificações no cérebro produzem modificações na mente."

Vinícius, não acha que colocar a mente como um PRODUTO ou resultado do cérebro é tomá-la como algo distinto deste? Se dizemos "produto", dizemos de algo que é gerado ou causado por, e isso per se abre margem para dicotomias -- inclusive a de substância. Em razão disso, prefiro pensar a mente (embora, enquanto behaviorista, não trabalho com o termo "mente") como a ATIVIDADE do cérebro -- EM TERMOS NEUROLÓGICOS, mente é aquilo que o cérebro faz (ou parte daquilo que ele faz). Isso elimina a brecha para o dualismo e possibilita falarmos de um mesmo fenômeno sob distintos pontos de descrição -- possibilita o pluralismo descritivo.

Abraços.