Pós-graduações IMED 2013

sexta-feira, 30 de novembro de 2007

O ambiente

O fisiologista Claude Bernard cunhou no século XIX a expressão millieu intérieur para se referir ao líquido extracelular. A função deste líquido é manter as condições ideais para a vida das células, que só pode ocorrer a partir da manutenção da troca de substâncias. O metabolismo celular precisa constantemente ingerir oxigênio e nutrientes e expelir os dejetos metabólicos, como o gás carbônico e demais produtos, e enquanto o líquido extracelular se mantiver em condições ótimas, a célula pode se manter viva.

No campo psicológico, pode-se utilizar o millieu intérieur como metáfora da regulação do comportamento. As pessoas estão constantemente se relacionando com o ambiente que as cerca, trocando principalmente informações. As informações são agentes que modificam o comportamento, podendo tanto dar indicativos de que tudo está indo bem quanto gerar sinais de alerta. Um bom exemplo disso são as relações familiares: por mais que se acredite, em parte erroneamente, que somos os "donos" de nossos comportamentos, pode nos afetar muito palavras duras vindas de nossos familiares como "Eu te odeio" ou "Você é um mentiroso".

O senso comum tende a considerar que as pessoas são senhoras da sua vontade, e que todos deveriam ter controle sobre seus atos. Sabemos que isso não acontece. Um dos fatores diz respeito aos elementos biológicos, pois existem pessoas mais propensas a comportamentos impulsivos e outras nem tanto. O outro fator é o ambiente, que é interpretado através dos mecanismos de aprendizagem. Muitas vezes aprendemos tão bem as coisas que acabamos por repeti-las sem nos darmos conta de que estamos fazendo; isto é o que faz uma pessoa responder: "Não sei porque continuo brigando com meus pais, mas eles continuam me irritando". Mas a aprendizagem é realizada a partir de interações com o ambiente: aprendemos conforme nos dizem o que é certo e errado fazer, e repetimos isso em nossas vidas. Isso significa que nosso millieu intérieur psicológico determina, em muito, aquilo que somos e o que fazemos.

sexta-feira, 16 de novembro de 2007

Dancem macacos, dancem

Por mais que se deseje acreditar que o ser humano é superior, nossa natureza não é diferente da dos demais seres vivos. Embora as pessoas se acostumem a pensar que são melhores, que a nossa espécie foi criada à imagem e semelhança de um ser superior, os cientistas têm dito que as coisas não acontecem bem assim.

Muito de nosso comportamento "civilizado" está relacionado com o comportamento animal. Seguindo a teoria da evolução, podemos compreender que a mente também passou pelo processo evolutivo assim como todos os órgãos, e pôde se tornar mais complexa em simetria com o aumento do volume encefálico. Contudo, há estruturas cerebrais primitivas relacionadas intimamente com comportamentos reflexos e processos emocionais que nem sempre são compreendidas em termos racionais, mas que de fato influenciam nosso comportamento de forma decisiva. Talvez essa influência seja aquilo que Sigmund Freud chamou de "inconsciente".

É óbvio para os estudiosos do comportamento que a dimensão emocional e a cognição estão intimamente relacionados. Isso significa que, quando temos um pensamento que gera uma imagem de uma situação triste, via de regra um sentimento de tristeza, em maior ou menor grau, é despertado, da mesma forma que, quando nos sentimos tristes, tendemos a recordar mais dos maus momentos que vivemos do que dos momentos felizes. Portanto, dizer que o pensamento é racional e puro, no sentido de que é desprovido de uma "carga" emocional, é sustentar uma quimera. Mas esta "obviedade" passa desapercebidamente pela maioria das pessoas, e continuamos a dividir nossos atos em "racionais" e "irracionais" como se fossem algo qualitativamente diferentes. Mas não são.

Gostamos de acreditar que somos superiores porque fomos à Lua... porque construímos armas atômicas... porque conseguimos um grande nível de manipulação biológica... mas pensamos em nossos colegas de espécie que morrem de fome? que morrem de frio e que são discriminados por suas crenças ou comportamentos? Pensando assim, talvez não sejamos mais do que macacos dançarinos, e só nos reste continuar dançando (recomendo: Dancem, macacos, dancem e Eu, primata).

quinta-feira, 1 de novembro de 2007

As bruxas e a mente

Pêlos de aranha são úteis para a adivinhação do futuro, desde que combinados com os elementos certos; senão, nada aparece ao vidente, ou pior, pode revelar aspectos sombrios da criação. Da mesma forma, é possível que os astros, localizados a trilhões de quilômetros, também influenciem o comportamento. Irreal? talvez a diferença entre essas duas proposições seja que menos pessoas acreditam na primeira, sobre os pêlos da aranha, do que sobre a influência dos astros, também conhecida por astrologia.

Essas e outras crenças por muito tempo guiaram as pessoas como referência de comportamento. Ainda hoje há quem acredite que os astros influenciam o destino das vidas humanas. Mas como os astros poderiam influenciar o comportamento das pessoas? Pela gravidade, ora. Mas Carl Sagan, na série Cosmos, mencionou que o médico que faz o parto de uma criança exerce muito mais força gravitacional sobre ela no momento do nascimento do que, por exemplo, Plutão (que não é mais considerado planeta, mesmo que os astrólogos continuem considerando-no com a mesma importância de antes): isso porque a distância é um dos parâmetros para a mensuração da força gravitacional. Portanto, este médico teria mais condições de determinar o futuro da criança do que a influência de um planeta.

Da mesma forma, muitas idéias sobre a mente e comportamento estão mudando. Cada vez mais se conhecem as relações entre a mente e o cérebro, identificando setores responsáveis, por exemplo, por sentimentos de raiva, autocontrole e a consciência. Assim, lentamente velhas crenças sobre o comportamento são substituídas por uma visão científica. A ciência nunca vai explicar tudo, mas um conhecimento mais preciso sobre o comportamento humano sempre é mais satisfatório que um conhecimento mais amplo e impreciso. Mas um dia as bruxas deixarão de rondar a psicologia?